sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

Manto de Fogo - Parte II

Depois de um mês de pura calmaria, Katherine achava que não mais teria problemas em sua vida, era de manhãzinha, o sol havia nascido a pouco tempo e lá estava ela, já costurando.
    Normalmente não começava seus trabalhos tão cedo, mas aquela não era uma encomenda normal, era um presente para Joffrey. Naquela semana estavam os dois passeando pelo bosque e o rapaz rasgou sua blusa em um galho, como havia sido ideia dela o passeio, estava se sentindo culpada. Katherine e Joffrey haviam virado bons amigos, se viam quase todos os dias e mesmo que isso agradasse a ambos, às vezes Katherine quase se esquecia que o amigo não sabia o que ela era.
      Alguém bateu três vezes na porta, Katherine ergueu os olhos da costura, não esperava visitas, nem de Joffrey, suspirou, apenas esperava que não fosse outra maluca querendo matá-la, levantou-se e abriu a porta lentamente, era um cavaleiro, vestido com uma armadura prata brilhante demais, seu rosto era quadrado e mal tratado e seus olhos vibrantes.
      – Senhorita Katherine? – Perguntou ele.
     – Sim. – Respondeu, não gostava de cavaleiros, muito menos na porta de sua casa.
     – Tenho um aviso de Sir Johann, poderia entrar?             
     Katherine não conhecia nenhum Sir Johann e não esperava o conhecer.
     – Sua capacidade de falar não piora ai fora, nem melhora aqui dentro. – A jovem não saiu de frente da porta e o homem pareceu ficar irritado com sua insolência.
    – Se afaste do Jovem Johann – disse o homem ferozmente – Ou irá se arrepender dentro de uma fogueira, mulher.



      O homem virou-se, subiu em seu cavalo e foi embora.
     Katherine fechou a porta, não estava preocupada com seu segredo, era normal ameaçarem queimar como bruxa qualquer mulher que queriam que desaparecesse. Encostou-se na porta fechada, quem raios era Sir Johann?! A única coisa que lhe veio na cabeça era que provavelmente seria o pai de Joffrey, e o “Jovem Johann” era o Joffrey, afinal, já imaginava que ele vinha de uma família rica e era a única pessoa na qual podia se afastar, já que era seu melhor amigo, seu único amigo.
   Sentou-se e voltou a costurar, não sabia direito o que faria, pensou por várias horas, não era seguro ficar perto dele, mesmo que gostasse de sua companhia mais do que tudo. Tinha vivido por muitos anos sozinha e mesmo que fosse extremamente doloroso voltar, aquilo poderia ser um sinal que era seu destino permanecer sozinha. Naquela mesma tarde foi se encontrar com Joffrey no mesmo lago que se viram pela primeira vez, ele estava encostado numa árvore enquanto via o sol refletido pela água, ela se aproximou em silêncio e lhe tapou os olhos. Joffrey sorriu e tirou as mãos dela de seus olhos.
      – Suas mãos são delicadas, Kath. – Disse ele.
    – Obrigada, seria estranho se fossem grandes. – Katherine não estava conseguindo manter por muito tempo o sorriso no rosto, estava desanimada. Entregou a blusa nova para Joffrey e olhou-o nos olhos. – Espero que sirva, não é tão bonita quanto a que você rasgou, mas já é alguma coisa.
       – É muito linda, principalmente porque foi você que fez. – Joffrey estava agora muito mais confiante em expressar seus sentimentos depois que conheceu mais a amiga. Kath corou, mas manteve a cara séria.
     – Acho que não devemos nos ver mais. Então não me procure e adeus. – Katherine virou-se e começou andar para sua casa, não gostava de despedidas e na verdade, aquela era a primeira que fazia. Nunca teve tempo de se despedir de sua mãe adequadamente.
      – Simplesmente é assim?! Meu pai manda alguém te ameaçar e você corre? – Ele parou na frente dela, que estava boquiaberta.
       – Você sabia?
      – Claro que sabia, ele também me ameaçou. E além do mais, ele fez questão de me falar que também te ameaçaria.
      – E então? Não se preocupa com sua saúde ou a minha?
      – Me preocupo, por isso que acho que devemos continuar a ser amigos.
     Kath mordeu os lábios inferiores e segurou um sorriso.
      – Tenho mais coisas para costurar, Joffrey, até depois.
      – Amanhã te ajudo com as encomendas. – Joffrey sorriu e apenas observou a amiga ir embora.

  No dia seguinte a feira estava lotada e Katherine ainda não tinha encontrado Joffrey, fazia as entregas sozinha, assim levaria bem mais tempo, tinha pego mais encomendas que o normal, o que era ótimo e ruim simultaneamente. Já era quase hora do almoço quando resolveu entrar em uma estalagem para almoçar, sentou-se num canto mais vazio, o que não era muita coisa, já que todo lugar estava lotado. Um homem sentou-se bem ao seu lado, o que lhe incomodou. 
– Aqui sempre é lotado assim? – Ele sorriu para Katherine, era incrivelmente bonito, seus olhos eram azuis esverdeados, seu cabelo preto e sua pele bronzeada. Estava vestido como um viajante e seu sorriso era incrivelmente simpático e gentil.
– Às vezes. – Respondeu ela. Apesar da beleza do homem, ainda não gostava de estranhos. Ele continuou a puxar assunto e ela apenas respondia suas perguntas, mas quando se acostumou com a presença dele e a comida chegou os dois já estavam conversando normalmente. 
O nome dele era Antônio, estava apenas de passagem pela cidade e já iria embora naquele mesmo dia. Os dois terminaram de comer e Antônio insistiu em pagar o almoço de Katherine, esta aceitou sem questionar. Estavam na frente da estalagem quando Kath viu Joffrey se aproximar, estava com a bochecha direita inchada e um corte bem embaixo do olho. Não parecia muito feliz e ficou menos ainda quando viu a estranha e bela companhia de Katherine.
– O que aconteceu com você? – Perguntou ela colocando delicadamente a mão por cima da bochecha do amigo.
– Apenas um acidente. – Respondeu ele encarando o homem.
– Vou indo, tenha um ótimo dia, Katherine, espero que nos vejamos de novo algum dia. – Ele sorriu e começou a andar na rua, quando olhou para trás e disse – Melhor cuidar desse acidente antes que se torne muito frequente. – O homem sorriu e continuou seu caminho, levando ao seu lado, um cavalo branco.
– Quem era aquele? – Perguntou Joffrey.
– Acabei de o conhecer na estalagem, vamos para casa, precisamos limpar esse machucado.
– Mas você não terminou de fazer as entregas.
– Eu termino amanhã.
Os dois seguiram para a casa de Kath, era a primeira vez que ela atrasava uma encomenda em toda sua vida. De certa forma, aquilo significava alguma coisa. Não demorou para que chegassem na humilde cabana e para que Katherine começasse a limpar o ferimento do amigo.
– Então, foi seu pai? – Perguntou ela. 
Ele se manteve em silêncio. 
– Você acha mesmo que continuar com isso é certo, Joffrey? Está te prejudicando, talvez realmente devemos parar de nos ver, é o mais lógico.
Ela terminou de passar um líquido feito de algumas ervas medicinais no corte da bochecha e ele se levantou irritado.
– Você é a última pessoa que pode me falar sobre lógica, Katherine. Apenas cale a boca. – Joffrey saiu da cabana sem dizer mais nada, Kath ficou ali surpresa, nunca o tinha visto agir daquela maneira, sempre era tão gentil.
 Sem mais o que fazer e já tarde da noite, Katherine deitou-se na sua cama, sentia um cheiro suave de alfazema, mas não conseguia mais raciocinar, o sono estava muito pesado.
Katherine se viu quando era pequena, estava sozinha na floresta e cantarolava uma música que sua mãe lhe ensinara, sempre dizia que seu pai que havia feito aquela música. Andava entre os galhos quando se deparou com uma ave grande, suas penas eram azuis e verdes. Katherine tinha certeza que aquilo não era uma lembrança. A ave abriu o bico e emitiu um barulho agudo e insuportável. Tapou os ouvidos e viu a coisa mais estranha acontecer, a ave simplesmente virou uma bola de fogo num piscar de olhos. O som havia parado, mas o som em seu ouvido estava estranho e abafado. Sabia o que era aquilo, conhecia aquele feitiço, um feitiço do sonho, alguém estava tentando lhe mandar uma mensagem, olhou para o lado, o sol nascia gigantesco e muito brilhante. Não estava captando a mensagem e ainda sentia muita dor, olhou para suas próprias mãos e elas estavam sujam com seu sangue. Entrou em desespero e então conseguiu acordar. 
O cheiro de alfazema estava por todo quarto, soava frio e sua cabeça latejava. Escutou um cavalo relinchar, Katherine abriu a porta pensando que seria alguma visita, mas era apenas um cavalo amarrado a sua casa, sabia que não era qualquer animal, era aquele cavalo branco que havia visto com aquele viajante de nome Antônio. Pode ver que havia algumas bolsas penduradas, foi verificar, havia comida, roupas e até dinheiro. Será que ele estaria por perto? Olhou para os lados, escutou barulhos de passos apressados, mas quem saiu correndo de dentro da mata foi Joffrey, ele estava sujo e parecia extremamente preocupado, se aproximou de Katherine e com desespero a pegou pelos ombros.
– Graças a Deus você está bem. – Disse aliviado.
– Por que eu não estaria? – Perguntou, ele não respondeu.
O som de diversos cavalos se tornou claro, Joffrey arregalou os olhos.
– Precisamos sair daqui. – Disse ele, ela perguntou o porque, mas ele apenas a tentou puxá-la pelo braço.
– Se você não me contar, eu não irei.
– Por Deus, Katherine, eles estão vindo queimá-la. – Disse ele por fim.
   Katherine arregalou os olhos, era aquilo que a mensagem queria lhe dizer?! Antônio estava querendo lhe avisar?! Mas quem era ele?! Não tinha tempo de pensar em tantas respostas, entrou dentro da sua casa e pegou a única coisa que tinha em mente, uma velha sacola de pano com algumas coisas que eram de valor emocional e com todo o dinheiro que tinha, o resto poderia ficar para trás. Subiu no cavalo branco.
– Joffrey, eu realmente sinto muito, mas espero que saiba que este último mês foi uma época muito feliz para mim.
– Do que você está falando? Eu vou com você.
– Não, você não vai. – Katherine deu um sorriso amarelo e pôs o cavalo a correr, Joffrey não conseguiu acompanhar a velocidade e logo parou. – Adeus, Joffrey, vou sentir sua falta. – Gritou ela e ao olhar para trás viu o olhar devastadoramente triste do amigo e as chamas que destruíram a casa que viveu por toda sua vida. Cerrou os dentes na expectativa de não chorar. Queria nunca ter olhado para trás.


    Não sabia o que seria da sua vida agora, mas tinha recebido a mensagem. Tinha que ir pro leste, onde o sol nascia, e era para lá que iria. 


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